A Educação na América Latina

 


Os Ministros da Educação da América Latina e do Caribe, reunidos a pedido da UNESCO, na VII Sessão do Comitê Intergovernamental Regional do Projeto Principal para Educação (PROMEDLAC VII), realizada em Cochabamba de 5 a 7 de março de 2001, reconhecem que a execução desse projeto no curso das duas últimas décadas representa o esforço mais importante por parte dos países para tornar a educação uma prioridade nas nossas agendas de desenvolvimento.


Conscientes da importância da educação das crianças, dos jovens e adultos, os países da região fizeram grandes esforços para alcançar as metas do projeto, desde a sua instituição, em 1981. Alguns países fizeram progressos, especialmente no número de crianças matriculadas no sistema escolar. No entanto, a região como um todo ainda não alcançou os objetivos propostos.


Como governos, reiteramos nosso compromisso com os objetivos do Projeto Principal no Campo da Educação, para atingir uma escolarização fundamental para todos, proporcionar o aprendizado da alfabetização a jovens e adultos e levar a cabo as reformas necessárias tendo por meta melhorar a qualidade e a eficiência da educação.


Na América Latina e no Caribe existem ainda cerca de 40 milhões de analfabetos com mais de 15 anos, representando mais de 11% da população total da região. Essa situação impõe limites aos direitos humanos e de cidadania desses indivíduos, tornando-se por sua vez, um obstáculo ao aprendizado dos seus filhos. Todos os países devem continuar buscando métodos eficazes para erradicar o analfabetismo, inclusive através do rádio e da televisão.


Não se garantiu a educação fundamental para todos, pois algumas crianças não são matriculadas e persistem taxas significativas de repetência e evasão. Em conseqüência, nem todas as crianças completam a educação primária. Os governos devem continuar atribuindo uma prioridade elevada à cobertura da educação fundamental, até que todos os meninos e meninas em idade estejam matriculados e permaneçam no sistema educacional.


Além disso, são necessários maiores esforços para proporcionar serviços educacionais de melhor qualidade, buscando atingir a eqüidade, dadas as sérias diferenças que persistem, entrem os países e dentro deles. O primeiro estudo comparativo sub-regional do Laboratório Latino-americano para a Avaliação da Qualidade da Educação (1999) revelou essas diferenças e a importância, em termos de realização no campo educacional, de fatores tais como os profissionalismo e a dedicação dos professores, o ambiente escolar, o nível educacional das famílias e a disponibilidade nas escolas de livros de textos e materiais de ensino.


Reconhecemos que a situação socioeconômica atual da região afeta adversamente as possibilidades educacionais: presentemente, na América Latina e no Caribe há 220 milhões de pessoas vivendo na pobreza.


Um número cada vez maior de pessoas são excluídas dos benefícios do desenvolvimento econômico e social que acompanham a globalização, porque são afetadas por limitações na sua educação que as impede de participar ativamente nesse processo.


Reconhecemos também que há sinais de esperança de que será possível transformar o potencial da educação em um fator determinante no desenvolvimento humano. A presente culminação de uma fase de crescimento sustentado na expansão dos serviços e na cobertura da educação fundamental, dentro do contexto da busca de uma melhor qualidade e eqüidade, é testemunha de efetivos esforços de cooperação por parte dos governos e entre os países, assim como da crescente participação de novos atores. Há agora um claro reconhecimento da necessidade de promover a educação por toda a vida dentro de ambientes humanos e educacionais múltiplos e interativos, e de atribuir maior importância à questão dos valores. Queremos que a nossa educação se fortaleça mediante uma firme fundamentação na possibilidade do aprender a ser, fazer, conhecer e viver em conjunto, absorvendo ao mesmo tempo como um fator positivo nossa rica diversidade cultural e ética.


O Fórum Mundial de Dacar, de abril de 2000, fixou as seis metas de Educação para Todos, abrangendo assim os compromissos assumidos em São Domingo pelos Ministros da América Latina e do Caribe, através do seu Plano de Ação. Os Ministros se comprometeram a fazer com que os Estados Trabalhem em conjunto com a sociedade civil nas políticas, estratégias e ações destinadas a alcançar as metas estabelecidas.


Nestas condições, tendo conhecido e analisado os relatórios e as propostas apresentado na Sessão.


Declaramos:


1. nossa preocupação por não terem sido ainda alcançadas as metas propostas no Projeto Principal de Educação, que continuam a ser uma prioridade e compromisso fundamental par os países da região que até aqui não puderam atingi-las;


2. que os sistemas educacionais precisam apressar o ritmo da sua transformação, de modo a não se atrasarem em relação às mudanças que ocorrem em outras esferas da sociedade e a conduzirem a um qualitativo na educação. Os esforços que estão sendo enviados presentemente em favor da mudança sistemática, por meio de reformas na educação, terão pouca utilidade se não houver uma mudança nos atores e processos educacionais. Isto significa que precisamos focalizar nossa qualidade das práticas de ensino, vinculando-as a mudanças na administração escolar e aprimorando essas práticas e os seus resultados, de forma a facilitar a criação das condições necessárias para que as escolas tornem ambientes adequados de aprendizado para os estudantes;


3. que o papel dos professores é insubstituível para assegurar um aprendizado de qualidade na sala de aula. As mudanças pretendidas com a reforma se baseiam na vontade e na preparação do magistério. Enfrentar e resolver o problema dos professores com uma abordagem compreensiva continuará a ser um fator urgente e fundamental nos próximos cinco anos. A função e a formação docente necessitam ser repensadas com um enfoque sistêmico que integre a formação inicial com a continuada, a participação efetiva em projetos de aperfeiçoamento, a criação de grupos de trabalhos docentes nos centros educacionais e a pesquisa numa interação permanente. A participação de novos atores e a introdução de novas tecnologias precisam atuar no sentido de reforço da função profissional dos professores. Adicionalmente, precisamos considerar com urgência todos os outros temas que afetam a capacidade dos professores de realizar suas tarefas em condições trabalho apropriadas, que abram oportunidade para o crescimento profissional contínuo: remuneração adequada, desenvolvimento profissional aprendizado ao longo da carreira, avaliação do rendimento e responsabilidade pelos resultados no aprendizado dos estudantes;


4. que sem a educação não é possível o desenvolvimento humano. Sabiamente, a educação não pode por si mesma eliminar a pobreza, nem é capaz de criar as condições necessárias para o crescimento econômico sustentado ou o bem-estar. Mas ela continua a ser base para o desenvolvimento pessoal, e um fator determinante para a melhoria significativa da igualdade de acesso às oportunidade de uma melhor qualidade de vida. O que reforça a nossa convicção de que a educação é acima de tudo, um direito fundamental de todos, e de que os Estados, por mio dos seus governos, têm a responsabilidade inalienável de transformar esse direito em realidade. Dentro de uma região onde aumenta a desigualdade social, o fortalecimento e a transformação da educação pública representam um mecanismo fundamental para um efetiva democratização social. Isso exige políticas econômicas, sociais e culturais urgentes que apóiem as políticas educacionais orientadas fundamentalmente em favor daqueles que foram excluídos e marginalizados na América Latina e no Caribe, para que possam superar a sua atual exclusão de uma educação de qualidade;


5. que, em um mundo pluralista e diversificado, a América Latina e o Caribe têm muito a oferecer se tirarem proveito da riqueza de sua diversidade de etnias, língua, tradições e culturas. Para tanto, nossa educação deve não reconhecer e respeitar essa diversidade mas também valorizá-la, transformando-a em um recurso de aprendizado. Os sistemas educacionais devem abrir oportunidades de aprendizado a cada criança, jovem e adulto, cultivando uma diversidade de capacidade, vocações e estilos, e dando ênfase especial às necessidades especiais de aprendizado. Os governos e as sociedades têm a responsabilidade de respeitar integralmente esse direito, promovendo todos os esforços ao seu alcance para garantir que as diferenças individuais, socioeconômicas, éticas, lingüisticas e de gênero não se transformem em desigualdade de oportunidade ou qualquer outra forma de discriminação;


6. que se faz necessário o novo tipo de escola. É absolutamente essencial que as escolas sejam mais flexíveis e altamente sensíveis aos desafios, e que tenham uma efetiva autonomia pedagógica e administrativa. A elas deve ser dado o apoio suficiente que as capacite a organizar e desenvolver seus próprios projetos educacionais em respostas às necessidades e à diversidade a que servem, projetos os quais são elaborados coletivamente, e a assumir – juntamente com as entidade governamentais e outros atores – a responsabilidade pelos resultados. Isso exige que os governos proporcionem recursos financeiros, humanos e materiais a todas instituições educacionais e eles jurisdicionadas, orientando-as para os segmentos mais pobres da população;


7. que, como a educação é um direito e um dever de cada pessoa compartilha com a sociedade, é necessário criar mecanismo adequados e flexíveis para garantir a participação permanente de uma multiplicidade de atores, e estimular as práticas intersetoriais no campo de educação. Os mecanismos integrados devem tratar diferentes áreas da atividade educacional, a começar com a família, a sala de aula e a escola, dando atenção especial ao vínculo com o desenvolvimento local. Como condição necessária para aumentar a participação comunitária na educação, o Estado deve assumir uma liderança efetiva, encorajando a participação da sociedade no planejamento, execução e avaliação da pesquisa sobre o impacto das políticas educacionais;


8. que o status dos jovens como um grupo social estratégico na América Latina e no Caribe exige solução educacional específicas que proporcionem aos jovens habilitações para viver, para trabalhar e para a cidadania. A educação secundária deveria ter uma prioridade regional naqueles países que alcançaram pleno acesso à educação fundamental. A opção de estimular formas novas e flexíveis de aprendizado representam uma resposta no que diz respeito aos jovens e adolescentes que vivem na pobreza e na exclusão – aqueles que abandonaram a educação formal sem ganhar acesso a uma educação de qualidade. A realidade do atual mercado de trabalho, em um contexto de poucas oportunidades para o emprego formal, exige o treinamento para o emprego, superando obstáculos para assegurar uma transição efetiva do sistema escolar para o emprego. Além disso, problemas cada vez maiores violência juvenil, dentro e fora da escola, de dependência de drogas, de gravidez e paternidade de adolescentes, assim como o baixo nível de participação dos jovens na cidadania, exigem esforços na educação de valores e soluções urgentes por parte dos estudantes e da sociedade;


9. que é necessário ampliar a atenção dirigida pela educação formal e não-formal aos grupos de crianças de muito pouca idade e de adultos que até aqui não foram considerados adequadamente nas estratégias nacionais, e cuja educação constitui uma condição necessária para melhorar a qualidade e a eqüidade no aprendizado ao longo de toda a vida;


10. que o ensino das tecnologias de informação e comunicação deve ter lugar dentro do contexto das políticas sociais e educacionais comprometidas com a eqüidade e a qualidade. Nos próximos anos um claro desafio será a construção de um modelo de escola no qual estudantes e professores possam aprender a usar a tecnologia a serviço dos seus respectivos processos de aprendizado. No entanto, não se deve esquecer que a decisão de tornar esse ensino mais eficiente deve levar em conta primordialmente a potencialidade das pessoas – especialmente a dos professores – e o respeito pela identidade cultural, e não apenas as promessas da própria tecnologia. O recurso à tecnologia abre novas possibilidade para a educação a distância e para o desenvolvimento de redes de aprendizado que podem fazer muito para tornar uma realidade o aprendizado ao longo de toda a vida. A introdução de tecnologia – como os computadores – nas escolas públicas deve ser vista como um fator de igualdade de oportunidade, assegurando a amplitude do acesso a esses instrumentos educacionais;


11. que, para melhorar a qualidade, a abrangência e a relevância da educação, é necessário aumentar de forma significativa os fundo a ela destinados, buscando uma maior eficiência no emprego desses recursos e na eqüidade da sua distribuição;


12. que os países da América Latina e do Caribe precisam contar com uma cooperação internacional renovada, que contribua para o desenvolvimento das tarefas e propostas da presente Declaração, o fortalecimento do processo decisório e da capacidade de execução nacionais. Assim além de tomar a Declaração de Dacar como um quadro de referência, é importante introduzir neste projeto iniciativas hemisféricas como a Cúpula das Américas e as iniciativas internacionais que têm permitido a participação de novos atores e enriquecido os projetos de desenvolvimento educacional. A validade desses compromissos e acordos exige a sustentação de um relacionamento positivo e saudável com as instituições internacionais que proporcionam apoio técnicos e/ou financeiro aos projetos de desenvolvimento educacional. A validade desses compromissos e acordos exige a sustentação de um relacionamento positivo e saudável com as instituições internacionais que proporcionam apoio técnicos e/ou financeiro aos projetos de desenvolvimento educacional da região, estimulando a responsabilidade dessas instituições pelos resultados obtidos com a sua cooperação. Devem ser feitos maiores esforços para assegurar que essas agências respeitem as prioridades, interesses e características de cada nação, estimulando a cooperação horizontal entre os países;


13. que, considerando os fatores acima especificados e a necessidade de ações, na América Latina e no Caribe, que incorporem objetivos a atividades comuns, acreditamos ser necessário solicitar à UNESCO que tome a iniciativa de organizar, juntamente com os Ministro da Região um Projeto Regional com uma perspectiva de quinze anos que inclua os elementos fundamentais desta Declaração, de acordo com as recomendações emanadas desta Sessão, com avaliações periódicas a cada cinco anos.


Cochabamba, Bolívia, 6 de março de 2001.

 


Instituto de Pesquisas Avançadas em Educação

( 200  ) 09/02